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sábado, 28 de novembro de 2009
Pendores ao bem e ao mal: Uma análise sobre a teoria Kantiana do livre-arbítrio e a moral das máximas
Em primeiro lugar para entender as teorias que envolvem Kant, seria de grande importância discorrer sobre a sua vida e de como era a sociedade em que ele vivia. Immanuel Kant nasceu em Konigsberg no ano de 1724. Em 1740 começou seu estudo em Teologia, embora tivesse grande interesse em Filosofia e Matemática as quais dedicava boa parte de seu tempo. Teve notável participação na elite local sendo tutor de jovens abastados. Em 1770 começa a lecionar na Universidade, abrangendo amplos temas que envolvem Antropologia, Filosofia e Matemática. Metódico cumpria sempre o mesmo ritual, tinha horários rigidamente inflexíveis, marcas visíveis de uma influente educação luterana recebida de sua mãe. Era protegido por Frederico II da Prússia, seu grande admirador. O sucessor de Frederico II, Frederico Guilherme II, proibiu Kant de escrever sobre Religião. Kant Morre em 1804.
Kant viveu num período de intensas mudanças políticas, religiosas e culturais, sendo que pode presenciar a mais importante mudança intelectual, o movimento Iluminista, onde teve concordâncias e discordâncias e criou até adversários intelectuais, como Rousseau. Mas, diferenças a parte, Kant teve, grosso modo, mais espaço para pensar do que seus antecessores e grandes mestres inspiradores como Descates e Platão, do qual se atribui as primeiras reflexões do idealismo, com o mito da caverna, onde o homem apenas vê um feixe de luz e vai a caminho do encontro desta. Ou então como Berkeley, que criador do Idealismo Dogmático, deu alguns subsídios necessários para a teoria Kantiana (embora o Idealismo dogmático se choque com o Transcendental de Kant). Provavelmente as maiores discordâncias entre Kant e Berkeley fossem o método, que Berkeley ainda se valia da empiria (escola a qual pertencia e foi iniciada por Hume), que é atacada ferozmente por autores como o próprio Kant, ou então o entendimento na capacidade ou não dos objetos inanimados se “comunicarem” com o sujeito.
Suas teorias foram massacradas depois de sua morte, principalmente quando da época áurea do positivismo, que se baseava no documento como verdadeiramente o único material que dispunha do fato verídico, por tanto, buscava no método empírico a forma de construir sua teoria. Um autor que promove duras críticas posteriormente é Friedrich Nietzsche, que combate às idéias desde Platão até Hegel, tendo uma visão histórica, filosófica bem diferente das de Kant. O autor mais atual que li, que se contrapõe a Kant, é o espanhol Leonardo Pólo, do qual me foi útil no entendimento de certos conceitos referentes à Teoria do Conhecimento e a Metafísica.
Atualmente este autor é retomado e tem sua importância reconhecida, principalmente por historiadores da Nova História Cultural, e alguns estudiosos das demais áreas, como a Filosofia.
CAPÍTULO I – A INERÊNCIA DO MAU PRINCÍPIO AO LADO DO BEM OU DO MAL NA NATUREZA HUMANA
No primeiro capítulo, Kant demonstra sua discordância quanto às raízes do homem, que segundo Rousseau “o homem é naturalmente bom, nasceu bom e livre, mas sua maldade ou sua deterioração adveio da sociedade” (ROSSEAU, Jean-Jacques, pág 15, 2008).
“Que o mundo é mau, essa é uma queixa tão antiga quanto à história e até mesmo mais antiga ainda que a poesia, bem mais, tão antiga quanto o mais antigo de todos os poemas, a religião dos padres. Para todos eles, contudo, o mundo começa pelo bem, pela idade do ouro, a vida no paraíso ou por uma vida mais feliz ainda, em comum com os seres celestiais. Entretanto, fazem logo desaparecer essa felicidade como um sonho; e então ocorre a queda no mal (o mal moral, com o qual o físico sempre andou junto) que a fazem precipitar-se acelerando-a, para nosso pear, de modo que agora (mas esse agora é tão antigo quanto a história) vivemos nos derradeiros tempos, porquanto o ultimo dia e o fim do mundo estão próximos. Por isso em algumas regiões do Industão o juiz e o destruidor do universo Ruttren (chamado também Siba ou Siven) é honrado como o deus que detém atualmente o poder, depois que o conservador do mundo, fatigado de suas funções, recebidas do criador do universo Brahma, as havia já anulado havia séculos”.(KANT, Immanuel, pág 27,2008)
Citando a ideia de paraíso terrestre que teria sido abalado por um mal inicial, Kant diz que o que acontece na verdade é um uso inadequado de método, este certamente empírico. Em primeiro lugar, o homem não pode ser definido como inicialmente bom, logo o estágio “mau” cairia em desuso. E segundo lugar o método empírico não formaria teoria para a origem de sua disposição natural, logo o que se tornaria o homem, enquanto ser e sociedade, se perderiam de significados. Diz que o ideal de Sêneca e Rousseau, por demais moralista, tentava incutir que o homem tinha em si o germe do bem. Mas, Kant insiste que o que deve se propor seria o caminho do meio, uma solução media. O que na verdade diz que o homem não é mau porque age de forma má, mas sim porque suas máximas são más. A empiria só serviria para comprovar os atos contrários as leis, que são atos maus certamente, mas não se pode observar as máximas nelas, nem mesmo por ser na mesma pessoa. Por isso, a empiria não pode ser usada como construtor de teoria histórica. Para esclarecer um pouco o termo natureza, podemos usar o que Kant afirma ser “o fundamento subjetivo do uso da liberdade”, o livre arbítrio, que mais adiante trataremos com mais propriedade.
Com isso, chegamos a outro termo, o pendor. O homem seria hospede de pendores naturais, que se e somente se confirmariam quando este através do livre arbítrio e o uso da liberdade, criaria uma máxima. Do contrário, sem o fundamento livre, o homem estaria à mercê de um instinto natural e nunca um pendor.
Então:
“Quando dizemos que o homem é bom por natureza ou que é mau por natureza, isso significa somente que possui nele um princípio primeiro que lhe admite conceber boas ou más máximas (isto é, contrárias à lei)”.(KANT, Immanuel, pág. 30, 2008).
Este uso do livre arbítrio, uma característica movida através do âmbito racional, lhe é inato, e o diferencia dos outros animais. A falta não é causada pela natureza, se for mau, nem o mérito se for bom, sendo o homem o único autor de suas próprias linhas.
A partir disso, aparece outro questionamento, se o homem é bom ou mau moralmente em sua natureza (essência). Uma das repostas que me parece mais viável é o que Kant disse ser, nenhuma das coisas e as das coisas ao mesmo tempo. Mas, como assim? Se há ambigüidades, logo não há máximas!
Evidentemente uma cisma aparece em cima desta pergunta, já que se não se tem uma máxima o próprio método empírico pode voltar a tona como fator de definir a natureza humana e suas implicações ao longo das sociedades. Mas o livre arbítrio também tem sua natureza peculiar, logo não pode cair no determinismo rigorista , a menos que o homem a tenha admitido em sua máxima.
Mas a lei moral deve ser por si só motivo para seu cumprimento, não seria? Porque se a lei não determina por si mesma o respeito ao ato que a pessoa tem, é necessário que o motivo contrário tenha influências do livre-arbítrio; sendo que neste caso o homem também tem de admitir sua máxima. Ora, então o homem não é moralmente bom ou mau, porque qualquer uma de suas escolhas está subjugada a escolha da máxima. E a intenção, o que cabe ao subjetivo, é o primeiro passo a admissão das máximas, sendo o uso geral da liberdade. Neste momento, segundo Kant:
“Tenhamos o direito de entender por homem, do qual dizemos que é por natureza bom ou mau, não um individuo em particular (pois então poderia ser considerado como bom por natureza e outro como mau), mas na realidade toda espécie, é o que não poderá ser demonstrado senão mais tarde, quando a pesquisa antropológica tiver feito ver que as razões que nos autorizam a atribuir a um homem um dos caracteres como inato, forem tais que não haja lugar para excetuar um só homem e que o que valer para ele valha para toda espécie”.(KANT, Immanuel, pág 34, 2008).
CAPÍTULO II - DISPOSIÇÂO NATURAL PARA O BEM NA NATUREZA HUMANA
De maneira bem sintética, o homem se enquadraria em três variantes gerais: A disposição do homem, enquanto ser vivo a animalidade; Sua disposição à humanidade, enquanto ser vivo e racional; sua disposição à personalidade, enquanto ser racional apto à responsabilidade.
Em primeiro lugar, o homem animalesco, tem o amor de si fisco e mecânico, não necessitando d a razão. Ela é tripla: conservar a si; a espécie, através do ato sexual típico do espírito da animalidade; associação a outros homens, embora o homem tenda a se associar, fica divagando e contradizendo-se sobre o pendor de associar-se e de isolar-se de todos (tendência subjetivista). Os possíveis vícios animalescos são a intemperança, lascividade e anarquia.
Em um segundo momento a humanidade atinge um amor de si ligado a uma certa razão ou ação racional, que é feita por modo comparativo. Desse amor provém a inclinação de conferir-se um certo valor de juízo a outrem. Surgem vícios como a inveja, rivalidade, ingratidão, que por muitas vezes tem a mera finalidade de superar o próximo.
Por fim, a disposição à personalidade, aptidão de seguir a lei moral, que não é disposição natural, mas sim arbítrio que nos leve a uso da liberdade. Embora o homem use a razão em sua plenitude apenas neste estágio, as duas anteriores não o podem ser abandonadas, sendo que resultaria no fim do próprio ser, é sua essência.
CAPÍTULO III – PENDOR PARA O MAL NA NATUREZA HUMANA
Também este preceito se define por três aspectos básicos, embora antes seja adequado fazer algumas ressalvas. O pendor é um desejo, uma vontade; o mal que trataremos não é o mal moral, já que o arbítrio não pode ser julgado, sendo que está em suas máximas, deve ter a possibilidade de se afastar das máximas da lei moral. A aptidão ou inaptidão ao arbítrio, proveniente do pendor natural, é designado de boa ou má vontade.
A primeira máxima adotada é a da fragilidade da natureza humana é expressa até mesmo na queixa de um apostolo.
Em segundo lugar, a impureza do coração (impuritas improbitas) consiste, segundo o objeto, é sem duvida boa, se levarmos em conta a sua máxima. Neste caso, as ações ganham intencionalidade e não o dever pelo dever, o que é mau, ou seja, representa a má vontade.
Em terceiro lugar, maldade (vitiosas, pravitas) ou corrupção (corruptio) do coração humano, cria “falsas” máximas, de acordo com o que fogem da Lei moral.
Não há diferença entre um homem de bons costumes e de boa moral. Mas seria o homem mau por natureza?
CAPÍTULO IV – O HOMEM É MAU POR NATUREZA
O homem é mau. Sim, mas porque usamos esta expressão que por vezes parece-nos algo inato a sua essência humana?
Segundo Kant, o homem é mau quando tendo consciência da lei moral e, contudo, admite em sua máxima, ainda assim afasta-se dela. Isso em caso de espécie, mas à medida que conhecemos o homem podemos supor este pendor, através desta idéia da contravenção da máxima. Podemos tentar supor alguma teoria, através de suas proposições: o homem bárbaro e o homem civilizado.
O homem bárbaro, através de alguns casos como os sangrentos casos de Tofoa, da Nova Zelândia, das Ilhas dos Navegadores , seria um homem desprovido de idéia de civilização e então não seria capaz de resolver nada por meios pacíficos e benéficos a outrem. Seriam enormes os vícios da barbárie.
Mas, se colocássemos o conceito de Estado civilizado em jogo, se acreditássemos que a civilização é o melhor método de se viver. Muito certo, mas o que poderia se dizer quando povos civilizados se encontram e frente àquele processo referido anteriormente, o da disposição à humanidade, o que provoca cobiça/inveja em comparação, colocasse em estado de verdadeira selvageria ambos, lutando por qualquer que seja o motivo, de forma carnificina. Será mesmo que a cultura e a civilização são os definidores da razão humana? Seriam apenas eles suficientes?
Aqui entramos na questão dos quiliasmos. O quiliasmo filosófico que almeja um estado de paz perpétua e o quiliasmo teológico que espera a realização do melhoramento moral de todo gênero humano. Seriam estes também possíveis?
Isso não tem como definir ou saber a resposta por hora, mas retornando a nosso assunto de foco, qualquer homem, até mesmo o mais “mau” de todos, quaisquer que seja as suas máximas, nunca renuncia a lei moral, já que para agir de forma rebelde há que se considerar ao menos esta mesma máxima, como ser a ser corrompido. Ora, então até mesmo sendo mau o homem leva a sério à máxima, tornando-se isento deste signo mau. Então não pode ser nenhum homem sequer mau? Evidentemente se um homem levar em conta somente seu arbítrio, em sua máxima, sem referencia a lei moral, seria moralmente mau.
Neste estudo preliminar estamos tentando definir quando o homem é mau e quando é bom, mas poderíamos contrapor um ao outro e perceber suas diferenças? Não. Na verdade apenas a subordinação (sua forma) define, ou seja, o homem só é bom ou mau em contraposição ao outro, estabelecendo condições a outrem. O homem só é mau se inverter a ordem moral dos motivos de suas ações. Neste caso, o caráter empírico é relevante, mas o caráter inteligível permanece sempre mau. O mau deve ser procurado no livre-arbítrio e que em decorrência imputável, é moralmente mau. Daí a razão, que pode agir como controladora das ações, impedindo o homem de agir mal moralmente e lhe dando a liberdade, embora pareça contraditório.
CAPÍTULO V – A ORIGEM DO MAL NA NATUREZA HUMANA
Origem é aquilo tudo que é primeiro, ou seja, aquilo que e de onde surge, não sendo efeito de nada. Existem dois tipos de origem: temporal e racional. A primeira origem, a temporal está leva em conta o evento e coloca este situado no tempo, enquanto que a segunda apenas o analisa como evento. Para nós que queremos entender o efeito nas leis da liberdade do mal moral, a origem racional é mais adequada. De todas as maneiras de dizer de onde vem o mal original, a pior de todas é a que imputa ao homem o mau passado pelos nossos primeiros ancestrais por hereditariedade. O que erramos é o método, já que se procuram o mau, não os pendores (intenções). O que se imagina é que o homem saiu do estado de inocência para o estado de ser mau. Isto pertence já a origem temporal, onde o pecado original que nos traz maus para o mundo. Isso nos leva a crer, que a natureza má seja nos algo inato, que esteja fixado em nossa essência natural, mas nunca se consideram os pendores. Agora para entender o local de origem, deve ser voltar a um passado histórico muito anterior ao uso da razão, e o homem teria ganhado na origem juntamente com a razão o pendor ao mau...
Quanto à origem desse desacordo no nosso arbítrio, permanece para nós insondável, já que isso acarretaria uma adoção de uma máxima má, o que obviamente, provocaria um mal moral (o que é mal moral nunca está de acordo com as máximas, e sim com o arbítrio). Então nossa disposição natural é para o bem, sendo papel do próprio homem corromper este bem. Então, o mal para nós em termos gerais ainda é desconhecido em sua origem (e em muitas vezes em sua essência), mas o homem tem sido presa deste mal, unicamente por sedução (pendor). Não é corrompido na sua essência, mas sim após isso, após seu fundamento. Kant diz que “Assim no homem que, apesar da corrupção de seu coração guarda ainda boa vontade, permanece a esperança de um retorno ao bem, do qual se afastou”.(KANT, Imannuel. Pág 55, 2008).
Conclusões gerais
Em primeiro lugar, ler Kant é mergulhar em um universo abstrato da alma humana, sem ser redundante obviamente.
É interessante notar como Kant em suas obras retrata, as indagações humanas sobre a estética, sobre a “religião”, sobre a política, sobre a metafísica e a História. Em meu caso, quis observar a partir de um recorte do seu livro A Religião nos limites da simples Razão, talvez uma das várias reflexões humanas a que tange as origens, mais especificamente as origens do bem e do mal e seu evidente relacionamento com as religiões. Faço usando me deste recorte já muito trabalhado no meio acadêmico, uma análise de suas teorias, que estão inseridas dentro desta temática, mas que são visíveis aos iniciados em Kant. Se método contrário ao empírico também ganha importância na contraposição aos positivistas.
Mas, centro meu trabalho em torno da questão dos pendores. Nesta faço percebemos as grandes discussões teóricas entre Rousseau e Kant, que digladiam quanto à questão do homem e sua natureza boa ou má.
Por fim, gostaria de parabenizar a todos que resolveram fazer o trabalho de Grau 2 sobre Kant e lembrar o quanto é interessante fazer as contraposições históricas e teóricas entre os casos anteriormente citados, por exemplo, e evidentemente, realizar um estudo dos “mestres” em que Kant bebeu, embora alguns destes fossem de correntes de pensamento contrárias ao Idealismo alemão, como Berkeley, Hume, Descatés (empiristas).
REFERÊNCIAS GERAIS:
DOSSE, François. A História. Tradução Maria Elena Ortiz Assumpção, Bauru, São Paulo. EDUSC, 2003.
GARDNER, Patrick. Teorias da História, 4 edição, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 1995.
Grécia Terra dos deuses, Os grandes Filósofos, edição n2, editora escala, São Paulo 2004.
KANT, Immanuel. A Religião nos Limites da Simples Razão. Editora Escala, São Paulo, 2008.
PLATÃO, Coleção os pensadores. Editora Nova Cultural, São Paulo, 2000.
PÓLO, Leonardo. A crítica Kantiana do Conhecimento. Editora Escala, São Paulo, 2007.
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